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Pobreza extrema beira 80% na Venezuela

A Venezuela deixou de ser um país com parâmetros de padrão de vida na América do Sul. O nível de pobreza que alcançou nos últimos anos, e que continuou crescendo entre 2019 e 2020, situa a nação petrolífera em outra escala. Estas são as conclusões da mais recente Pesquisa de Condições de Vida na Venezuela (Encovi), o estudo feito por um grupo de universidades desde 2014 e que se tornou o raio-x mais rigoroso dos principais indicadores desde que o Governo parou de publicar estatísticas . Depois que ficou para trás uma década de boom das receitas do petróleo, hoje o país é o mais pobre da região e o segundo mais desigual, de acordo com medições feitas com base em entrevistas em quase 10.000 domicílios. Os dados mostram o avanço do colapso econômico e o reajuste demográfico e social que a migração forçada de cinco milhões de venezuelanos provocou.

Visto de forma multidimensional, passando pela peneira de variáveis relacionadas com emprego, educação, condições de moradia e serviços públicos, a pobreza alcança 65% dos domicílios, com aumento de 13,8% entre 2018 e 2019. A pesquisa considera um novo indicador chamado de pobreza de consumo, no qual situa 68% da população, que consome menos de 2.000 calorias por dia por dia. A insegurança alimentar e a precariedade dos serviços se tornaram um fator de equalização no país. Não há diferenças notáveis entre os setores mais pobres e os mais ricos nesses aspectos. Embora a camada com renda mais alta consuma cinco vezes mais carne do que a mais pobre, a maioria da população consome menos proteína do que as 51 gramas recomendadas por dia. Apenas 32% da população alcança esse mínimo. A isto se somam os dados antropométricos sobre desnutrição infantil: 30% das crianças com menos de cinco anos ―639.000 crianças― têm desnutrição crônica ou baixa estatura, porcentual que está bem acima dos vizinhos da região e é superado apenas pela Guatemala.

A Venezuela passou a ter condições mais típicas dos países da América Central, Caribe e África em termos de pobreza e desnutrição. Quando se juntam as variáveis de instabilidade política, PIB e pobreza extrema, a Venezuela aparece em segundo lugar de uma lista de 12 países ―que tem a Nigéria no topo e o Irã no final―, seguida do Chade, Congo e Zimbábue.

A composição da população venezuelana também mudou nos últimos anos. Há quatro milhões de habitantes a menos no país e em 19% dos domicílios alguma pessoa emigrou entre 2014 e o ano passado. Outra das conclusões do estudo confirma a perda do chamado bônus demográfico, a janela conjuntural favorável experimentada pelos países quando a base populacional é composta por pessoas economicamente ativas e a porcentagem de menores de 15 e maiores de 65 anos, os mais dependentes, é reduzida.

A conjuntura que se abriu em 2003 e deveria permanecer até 2045 não foi aproveitada para expandir a economia e dar emprego àquela população que estava pronta para trabalhar”, explica a demógrafa Anitza Freitez. O estudo relata que o envelhecimento da população se acelerou, há mais domicílios unipessoais que fazem parte da onda migratória, 44% da população que deveria trabalhar não o faz e caiu pela metade a cobertura educacional entre os 18 e 24 anos: há 2,2 milhões de jovens que não estão estudando. “Todos os esforços para expandir o acesso em massa à educação universitária perderam o sentido; esses benefícios não chegam aos setores mais pobres”, alerta Freitez.

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