Campeã paralímpica pela primeira vez aos 42 anos, e logo em dose dupla, e agora com seis medalhas conquistadas em cinco participações em jogos paralímpicos, a velocista fez um resumo da carreira.
Jerusa Geber relembrou a infância, a perda total da visão aos 18 anos, o início no esporte em Rio Branco, capital do Acre, até o momento de ápice na carreira ao receber duas medalhas no topo do pódio no Stade de France, na capital francesa.
Confira as declarações da campeã
Infância e início no esporte
– Sou naturalíssima de Rio Branco, toda a minha família está aí, inclusive. Iniciei no esporte quando eu tinha meus 19 anos pra 20, a convite de um amigo meu, o Alcides, que também é cego total. Ele que comandava os treinos aí em Rio Branco na época. Eu não conhecia o esporte paralímpico e através dele, que abriu as portas do esporte adaptado em Rio Branco, me convidou pra eu ir no ginásio do Sesi e eu fui conhecer. Comecei apenas com caminhada, eu era muito fraquinha, muito magrinha, bem sedentária, pesava 39 quilos com 19 anos. E a partir daí fui me desenvolvendo no esporte. Fiquei mais ou menos seis anos em Rio Branco treinando e sentia que tinha condições de melhorar, de participar de uma competição grande, uma paralimpíada, por exemplo, era o meu sonho. Mas aí era tudo muito difícil, eu não tinha um atleta-guia fixo, era sempre mudando. Até mesmo os outros atletas com pouca visão que me ajudavam. A gente treinava do jeito que dava, no improviso. Tudo muito longe das competições. Não era sempre que conseguia participar de uma competição por falta de recursos e quando tinha a gente saía de Rio Branco de ônibus pra São Paulo e ficava três dias na estrada pra chegar numa competição. Tinha ano que a gente não conseguia ir. Era aquela frustração de treinar, treinar, treinar e quando chegava a hora de competir não tinha recurso, não tinha ajuda.
Origem da deficiência visual
– Eu nasci com a catarata congênita e não enxergava nada. Aos três meses de vida fiz minha primeira cirurgia. Foi quando passei a enxergar um pouco, eu tinha baixa visão e quando eu tinha oito anos foi diagnosticado que eu tinha glaucoma, que é pressão alta nos olhos. E se o médico não consegue controlar essa pressão do globo ocular acaba perdendo a visão. Foi o que aconteceu comigo. Aos 18 pra 19 anos eu tinha perdido toda a visão.
Superação através do esporte
– Cresci escutando que um dia poderia perder a visão. Então, naquele momento não imaginava que eu fosse entrar no esporte um dia, só estudava, fazia meu ensino fundamental, meu ensino médio. Tentei vestibular na faculdade federal e não passei. E eu me via sem (rumo): o que vou fazer agora? Perdi a visão total, fiquei muito triste, sem saber o que fazer. E foi quando o esporte apareceu na minha vida e foi nele que vi a saída de estar mudando de vida. Conhecendo pessoas maravilhosas que entraram na minha vida, como o Luiz (Henrique), que hoje é meu treinador e esposo, o Gabriel, que é meu guia.
Saída do Acre
– Como tudo era muito difícil e eu tinha um sonho, eu falava quando estava aí: “um dia quero participar de uma paralimpíada. Um dia quero viver do esporte”. Até então, eu não tinha investimento nenhum. Não recebia nada, não ganhava nada e foi tudo em busca de um sonho que eu tinha, que era pequeno na época. Eu queria um dia receber uma bolsa-atleta, participar de uma paralimpíada. Hoje já participei da quinta, ganhei seis medalhas em paralimpíadas. Nem imaginava ser medalhista um dia. Quando resolvi sair do Acre embusca de melhorar tudo isso foi pensando nisso. Primeiro passei por Cuiabá, em 2006, que fui pra lá foi onde conheci o Luiz. A gente ficou dois anos em Cuiabá. Depois da minha primeira paralimpíadas, de 2008 na China, a gente resolveu sair de Cuiabá e fomos pra Presidente Prudente, que é onde a gente está até hoje.
Treinador e marido: relação de sucesso
– Deus faz tudo muito certo, coloca as pessoas certas na hora certa. Ele já me conhecia, nas competições ele já me via. Quando eu competia ainda pelo Acre ele sempre estava me vendo nas competições. Mas eu conheci mesmo quando chegue em Cuiabá, quando meu antigo treinador me apresentou. Jamais imaginava que íamos nos dar tão bem, a gente está aí até hoje. Quatro, cinco meses depois a gente já começou um relacionamento. Não atrapalha porque, além do Luiz ser treinador, meu esposo, ele também competiu comigo, ele também foi meu atleta-guia. Ele sentiu e sente tudo na pele o que eu sinto como atleta, então ele consegue me entender.
Frustração em Tóquio 2021
– A gente fica bastante frustrada porque foram cinco anos que a gente esperou pra estar ali, se preparou tanto e tinha quase que uma certeza que aquele ouro (100 metros T11) ia ser nosso. Então, só naquele momento mesmo a gente desanima. Mas foi por um momento muito curto. Tive um dia só de descanso e já tinha que ir pros 200 metros. Tinha a prova seguinte pela frente e tinha que esquecer tudo aquilo que aconteceu. Estava bem desanimada e foi nos 200 metros também lá em Tóquio que acabou nos presenteando com a medalha de bronze.
Relação com os pais apesar da distância
– Muito próxima. Minha mãe é uma grande torcedora, tanto ela como meu pai. Minha família em geral, minha vó, minhas tias. A comemoração deles é muito importante, motiva muito a gente. Ter a minha mãe e o Luiz (marido e treinador) na arquibancada do Stade de France torcendo pra mim, vibrando, aquilo ali é inexplicável, não tem preço.
Mensagem para atletas e futuro no esporte
– Você tem que acreditar em você mesma. Não importa o que os outros pensam, o que os outros vão determinar, colocar limites sobre você porque nem você sabe dos seus próprios limites. Assim como não sei dos meus. Eu falava que ia parar no Rio (de Janeiro), falava que ia parar em Tóquio e cheguei em Paris em 2024. E não falo mais se vou continuar, se vou parar porque nem eu sei. Então, o meu futuro pertence ao Criador.
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