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Menino acreano de 11 anos lança livro sobre aves da Amazônia fotografadas por ele

O pequeno acreano Rodrigo Padula, de apenas 11 anos, desde muito pequeno confundia os pais com suas habilidades. Quando era mais novo, a mãe Fernanda, e o pai Thiago Brasil, achavam que o garoto inventava coisas, mas com o passar do tempo perceberam que ele sabia exatamente do que falava. Em 2023, decidiu fazer um livro sobre a avifauna presente nas proximidades do condomínio onde mora.

Os pais o definem como autodidata, já que os dois são da área jurídica e não precisaram incentivar as descobertas do filho. Padula sempre foi apaixonado pela área da ciência, principalmente com foco na zoologia, que estuda todos os animais e suas características.

Fernanda conta que seu filho já estudou sobre cobras, anfíbios, quelônios [são nomes que agrupam todas as formas de tartarugas identificadas no mundo] e depois descobriu a ornitologia [é caracterizada por estudar as aves e realizar um estudo abrangente sobre as características físicas das aves].

“Ele é um guia fotográfico da avifauna urbana. Como ele é uma criança, a gente teve que delimitar a área do nosso condomínio, porque ali ele tinha como sair andando e fazer os registros dele sem depender da gente para levar. Ele chegou pra mim e falou: ‘vou escrever um livro, vou classificar as aves conforme a alimentação e os hábitos’ e nós o apoiamos. Depois ele chegou e disse que já estava com material completo para publicar o livro”, relata Fernanda.

Sobre o livro, Padula explica que a obra é um ilustrado das aves da Amazônia Urbana que qualquer um pode ter acesso. Os registros fotográficos foram feitos entre 2021 e 2023, em uma grande área com paisagens naturais como: lagos, cocais e campos abertos, onde é possível encontrar espécies semiaquáticas, terrestres e líquidas.

“Eu escolhi o local de estudo porque é fácil de eu transitar por lá e registrar várias espécies. Todas as imagens foram organizadas por gênero e que vêm acompanhadas do nome científico, em inglês e o nome popular, e ainda vem com os hábitos alimentares das aves. Esse local faz fronteira com o Parque Zoobotânico da Universidade Federal do Acre (Ufac) onde encontrei a maioria das espécies como por exemplo: o papagaio-campeiro, o papagaio-moleiro, Maracanã-guaçu, entre outros”.

Padula explica que o objetivo de lançar o livro é tornar o conhecimento de ornitologia acessível, além de incentivar as pessoas a se interessarem pela observação de aves e se integrarem ao meio ambiente. “Quanto mais pessoas estiverem interessadas em aves, mais pessoas vão se preocupar em protegê-las”, esclarece.

O garoto já tem planos para lançar, em breve, uma versão mais atualizada com novas espécies que descobriu depois do livro já estar pronto. Na próxima obra, ele pretende observar a avifauna da região do Ramal do Noca, que fica na Transacreana, em Rio Branco. A partir do dinheiro arrecadado com a venda do livro, o garoto pretende utilizar para viajar para outros estados para fazer novos registros.

“Ele ainda pretende nas suas maiores ambições, viajar o Brasil inteiro e ir catalogando aves de regiões diferentes também. Mas claro, o foco dele é aqui a nossa região amazônica, porque ele é acreano, amazônico e tem muito orgulho de onde ele mora”, diz a mãe.

Interesse pela ornitologia

Fernanda conta que Padula tinha interesse pela ornitologia e sempre pesquisava vídeos no YouTube e acessava o site WikiAves. Ao passear no condomínio tirando fotos de algumas aves, ele foi avistado pelo professor dr. Edson Guilherme, ornitólogo e Doutor em Zoologia, que o perguntou se ele estaria “tirando fotos dos passarinhos”, porém foi surpreendido com o conhecimento técnico da criança com as aves.

Guilherme o convidou para conhecer seu laboratório, e desde então o interesse pela ornitologia só cresceu. “Através do professor Edson ele conheceu sobre o birdwatching [uma atividade recreacional que visa observar as aves em seu habitat natural sem interferir no seu comportamento ou no ambiente em que se encontram], que é algo muito popular no Sul e Sudeste do país e aqui no Acre tem pontos muito importantes que vem gente do Brasil inteiro para ver”, conta a mãe.

O professor de Zoologia e Evolução, diz que Padula conhece mais sobre as aves silvestres do que muitos estudantes da graduação. “Rodrigo é um menino-prodígio, uma criança excepcional. Ele gosta de zoologia, ele gosta da natureza e teve um apoio familiar muito grande, tanto do pai quanto da mãe. Por conta desse apoio, dando literatura, livros para que ele pudesse estudar e observar a natureza ele tem aprendido bastante. Com apenas 11 anos de idade ele conhece muito mais de pássaros do que alguns alunos meus da graduação que estão há oito meses no curso”, aponta Guilherme.

O doutor menciona que Padula é focado na ornitologia, mas ele gosta também de herpetologia [ramo da ciência que estuda os grupos de anfíbios e répteis]. “É um prazer conversar com o Rodrigo. A gente conversa de igual pra igual como se eu tivesse conversando com um cientista, sobre os nomes dos bichos, ocorrências, ele sabe tudo. Já falei pros pais dele, no dia que inteirar idade para entrar na universidade, as portas do meu laboratório estão abertas pra ele” afirma.

Fernanda ainda menciona que o pequeno conheceu alguns guias experientes de birdwatching no Acre, como Ricardo Plácido, da Secretaria de Meio Ambiente e Wilian Alencar do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), que o deixaram integrado com temas afins, e fizeram com que ele ficasse ainda mais encantado com a ornitologia.

A mãe explica que no começo pensava que Padula estava inventando os nomes das aves, por se tratar de nomes científicos e pouco conhecidos, porém após visitar conhecer o laboratório e os professores na Ufac, descobriu que ele realmente sabia o nome dos animais. Percebeu-se que ele tinha conhecimento técnico sobre a ornitologia e pouco tempo depois foi descoberta a superdotação.

Superdotação

Padula é aluno do 6º ano do ensino fundamental, do Núcleo de Altas Habilidades e Superdotação (NAAHS-AC). Fernanda conta que percebeu algo de diferente no filho desde muito novo. Segundo ela, ainda bebê, Padula era aficionado por dinossauros e pedia para que a mãe colocasse vídeos em inglês, onde eram ditos os nomes científicos dos dinossauros e ele conseguia decorar. “Quando ele começou a ler e ter acesso, ele vinha contar uns nomes difíceis pra gente, e a gente achava que ele estava inventando, só que aí depois quando ele começou a se comunicar melhor, ele começou a pedir os livros mais especializados e aí a gente foi ver que ele tinha algo diferente”, avalia.

Além da inteligência acima da média, os pais perceberam alguns sinais no comportamento de Padula. De acordo com a mãe, a superdotação vem acompanhada de outros fatores. Ela percebeu questões sensoriais, de sensibilidade com som e com algumas texturas. Foi aí que os pais decidiram fazer uma avaliação neuropsicológica, onde foram realizados vários testes, inclusive para medir o QI. Assim foi descoberta a superdotação.

“A superdotação dele é associada com autismo, nível de suporte 1, que realmente é um nível de suporte muito baixo. Até a própria neuro falou que a superdotação dele foi achando um jeito de suprir as necessidades e dificuldades que ele tinha por ter um QI elevado”, conta.

Pessoas que apresentam potencial elevado em qualquer uma das seguintes áreas, isoladas ou combinadas: intelectual, acadêmica, liderança, psicomotricidade e artes, são consideradas superdotadas. Também apresentam elevada criatividade, grande envolvimento na aprendizagem e realização de tarefas em áreas de seu interesse.

A OMS estima que existam entre 3% a 5% de pessoas com habilidades acima da média. Isso quando trata-se somente da superdotação acadêmica. Porém, quando são considerados os outros tipos de habilidades como o produtivo-criativo, a qual contempla as áreas como liderança, criatividade, competências psicomotoras e artísticas, a estimativa aumenta de 15% a 20%.

Núcleo de Altas Habilidades e Superdotação

Após a descoberta, ao buscarem um local para realizar o acompanhamento do filho, os pais descobriram a existência do NAAHS-AC. O espaço está vinculado ao Departamento de Educação Especial da Secretaria de Estado de Educação, Cultura e Esportes (SEE-AC), oferecendo serviços educacionais especializados no que se refere à identificação e ao atendimento dos alunos com características de altas habilidades/superdotação (AH/SD) e à formação continuada dos profissionais que atuam na educação básica, ofertando, também, cursos livres à comunidade.

Jeane Lira Jucá, Chefe do NAAH/S-AC, esclarece que o local tem como objetivo identificar e atender os alunos com características de altas habilidades/superdotação na educação básica. Também dissemina informações e conhecimentos sobre altas habilidades nos sistemas educacionais e na sociedade, através de cursos, palestras, projetos e ações.

“O objetivo do núcleo é identificar o aluno e atender o aluno com altas habilidades de forma pedagógica. Uma vez que o aluno tenha o parecer com características consistentes ou positivo para altas habilidades, ele continua o atendimento aqui, até o final do ensino básico. O atendimento aqui vai desde ensino infantil até o ensino médio”, diz Jucá.

No NAAHS, Padula é atendido desde o início de 2023. Foi realizado um processo de investigação com ênfase em características de superdotação e altas habilidades na área acadêmica e intelectual naturalista. O acompanhamento continua sendo feito dentro das áreas de interesse de Padula, que envolvem trabalhos de pesquisas em sites especializados, técnicas básicas de microscopia óptica, trabalhos manuais com argila, modelagem e impressão 3D.

Marcelo Loureiro, professor de atendimento educacional especializado do NAAH/S, expõe que o desenvolvimento do livro teve como ponto de partida o interesse dele por pássaros, que o levou a leituras aprofundadas, pesquisa em campo e contato especialista.

“Nos atendimentos relacionados ao desenvolvimento do livro buscamos sistematizar e organizar o conhecimento acumulado ao longo de meses por ele, através de fotos, leituras e consultas especializadas, de forma que fosse de fácil compreensão ao leitor. Foi um trabalho prazeroso para nós dois”, aponta o professor.

Futuro

Com apenas 11 anos de idade, Padula já tem grande planos para o futuro. Além de continuar estudando ornitologia, ele quer atingir o registro de 1 mil espécies. Atualmente ele possui 250 espécies catalogadas.

“Quero fazer um livro sobre os principais pontos de observações de aves que tem em Rio Branco. Esses locais atraem gente do Brasil inteiro pra vir aqui. Quero colocar as aves raras, que existem aqui que inclusive já registrei várias delas”, revela Padula.

g1

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