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Ex-procurador no Acre, solta o verbo…

Terror dos políticos nos anos 1990, o ex- procurador no Acre Luiz Francisco de Souza vê com maus olhos o futuro do Ministério Público. Em entrevista ao UOL, ele disse que o novo procurador-geral da República, Augusto Aras, não vai combater a corrupção dos grandes cartéis e dos políticos que se vendem: “Vai ser uma tragédia”, afirma.
Para além da polarização, ele distribui críticas também ao presidente Jair Bolsonaro (PSL) e ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Luiz Francisco foi responsável pela prisão do ex-senador Luiz Estêvão (ex-MDB, hoje no PRTB), e do ex-deputado Hildebrando Pascoal (ex-DEM). E, por anos, exerceu o cargo de procurador da República no Acre.

Gravou uma conversa com o então senador Antonio Carlos Magalhães (DEM) que resultou na renúncia de um dos políticos mais poderosos da história, por ter violado o painel eletrônico do Senado.

Sobre fatos mais recentes, Luiz Francisco diz torcer para que Bolsonaro sofra um impeachment. Ele chama o presidente de “Bozó”, personagem de Chico Anysio que trabalhava com um crachá da TV Globo.

Luiz Francisco não para por aí. Afirma que Lula errou ao frequentar um sítio em Atibaia (SP) e disse que o petista recebia mimos de empreiteiras com contratos no seu governo.
“O agente público não deve ter regalia, não deve receber nenhum benefício, nem direta, nem indireta de empresários”, afirma Luiz Francisco. Ainda assim, diz não acreditar que o petista seja corrupto.
O procurador afirma ter “vergonha” de ter Deltan Dallagnol, como colega no Ministério Público. Critica o coordenador da força-tarefa da Lava Jato no Paraná por dar palestras pagas. Para ele, as chamadas “dez medidas” contra a corrupção são “fascistas” e não têm o apoio dos demais procuradores da República.
Sobram críticas para o ex-juiz e atual ministro da Justiça, Sergio Moro, o governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), e o ex-procurador-geral Rodrigo Janot.
Ele faz elogios ao ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes por ser uma voz “garantista”, ou seja, que defende os direitos individuais no Judiciário. Também diz que a Lei do Abuso de Autoridade é “excelente” e que os excessos serão corrigidos pelo STF.
Luiz Francisco criticou a possibilidade de prisão logo após a condenação em segunda instância. Diz que é preciso que se esgotem todas as instâncias até o chamado trânsito em julgado.
Leia os principais trechos da entrevista concedida no estúdio de TV do UOL em Brasília, na última terça-feira (22).
UOL – O senhor, nos anos 90, era o terror dos políticos. Deltan Dallagnol é o filhote do seu trabalho?
Luiz Francisco de Souza – Não. Como membro do MP, eu sinto vergonha de ter o Deltan dentro da minha instituição. A gente é principalmente defensor de direitos humanos, de garantismo, do combate à verdadeira corrupção, o que significa defender o patrimônio público, as estatais, e não quebrar as empresas. As empresas são principalmente dos trabalhadores. A Odebrecht tinha 250 mil trabalhadores. Acho que só sobraram 60 [mil], e agora acho que não vai sobrar nenhum.
E quanto às pilhas de infrações que o [site] The Intercept e o Glenn Greenwald denunciaram, eu aplaudo de pé, porque mostra como a ação do MP não deve ser. Ela não deve ser nunca direcionada, nunca deve-se escolher um político para investigar, e poupar políticos que não podem ser constrangidos ou atacados. Ele dirigiu boa parte do MP só contra um partido, o Partido dos Trabalhadores. É claro que, dentro do PT, tinha gente corrupta, como aquele [ex-senador] Delcídio [Amaral] e o ex-ministro da Fazenda [Antônio Palocci].
Eu não tenho nada a ver com o Deltan, porque eu sou uma pessoa garantista. Não se pode perseguir o crime pisando na Constituição, pisando nos direitos das garantias nem destruindo Estado, muito menos destruindo o Estado social.
A Lava Jato e várias pessoas defendem a manutenção da prisão em segunda instância. Sem ela, muita gente diz que Luiz Estevão, por exemplo, já estaria solto.
Essa questão da prisão em segunda instância é uma das razões pela quais eu não tenho nada a ver com Deltan. Há 820 mil presos. São, na maior parte, pessoas negras em um verdadeiro campo de extermínio, onde os presos são torturados, onde tem violência sexual maciça.
Ao mesmo tempo tem cerca de 50 mil pessoas que estão presas por problemas mentais, tipo Adélio [Bispo, condenado por tentar assassinar Bolsonaro durante a campanha eleitoral]. E tem os menores e os adolescentes. Dá quase 1 milhão. Então, trabalhar o combate ao crime ampliando as penas não resolve.

Sinto vergonha de ter o Deltan dentro da minha instituição, diz Luiz Francisco
Imagem: Kleyton Amorim/UOL

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